quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

poema para um amigo

Mãos, de August Rodin


Se a manhã crescesse em forma de monte
se a manhã crescesse, meu amigo
talvez que eu conseguisse pintar um quadro
com a forma da tua alegria.

Emprestaste-me as tuas mãos
e com elas fui passear para o meio da floresta
contígua ao mar
próximo das nuvens que me baptizavam o rosto.

Serenamente, sem pressas
fui afastando as pedras que me cruzavam o caminho
como representativas figuras
que num palco nada representassem.

Como o fumo na minha boca
fui caminhando atrás dos cigarros
atrás desta pequena loucura
que em nada me aflige, em nada me altera.

Mas se por outro lado, a manhã crescesse em forma de névoa
então, meu amigo, estes olhos
baixariam à terra que me produziu
ao ventre que me gerou
à luz que se abriu solta
à revolta do meu choro
ao eternizar dos meus primeiros passos.
Talvez que eu não conseguisse pintar um quadro
com a forma da tua alegria.

José Manuel Capêlo, corpo-terra, Trelivro 1982

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