regresso à luz das estrelas com a brisa a soprar por detrás. caminho vagamente, como se não sentisse os pés tocarem o chão, momento único, distante, fértil de sensações e embaraços, grito a sair-me e a afundar-se-me na garganta, numa apoteose de multidões em aplausos de ante-estreia num coliseu de olhares. sobra-me o vento num silvo de companhia. puxo um cigarro do maço que tirara do bolso das calças soltas, coloco-o entre os lábios e faço-lhe sentir a frescura do ar em movimento ligeiro, mas prolongado. nada se me esquece. tudo se me aviva.
saboreio o silêncio da liberdade no caminho sem ninguém. sem qualquer pessoa, quero dizer. a noite é fácil e segura. respondem-me os ecos fáceis dos reflexos da sombra, nesse contraste que entusiasma, faz parar e dá para prosseguir. e sigo com as pernas que têm movimento. flexões de luzes percorrem os meus gestos e recriam-se no meu olhar. há canções ao longe na voz de um cantor de duas vozes. avanço e medito a liberdade que vou conquistando passo-a-passo.
José Manuel Capêlo, Enche-se de Eco a Cidade, Átrio, 1989
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