segunda-feira, 16 de março de 2009

há tanta gente... tão pouca gente

cena de Carnaval, de Francisco de Goya

Há tanta gente...
Uma enorme quantidade de gente!
E dessa gente...tão pouca gente.
Que me interessam livros ou poemas
se os deitei fora?
Que me interessam gestos e palavras
se ficaram pendurados à porta?...

Deixem-me bater as palmas
para chamar os sonhos
se é que os sonhos vêm com as palmas.
Deixem-me querer meter
no sorriso do louco
que me apareceu pela janela... a chorar.

Há tanta gente...
E eu, sem vontade de chorar!
Ah! quanta vontade
quanto dizer que sim
chamar os sonhos, sem bater as palmas
meter-me no sorriso do louco
que me apareceu pela janela a chorar.

Há tanta gente...
Uma enorme quantidade de gente!
E dessa gente... tão pouca gente.
Tenho sorrisos atrás de mim
palavras, com sentido, um pouco mais à frente
dedos que se estendem e procuram copos
que o vinho semi enche.

Tenho olhos que me olham, sem me verem
se bem que pensem que o façam.
São olhos que só me olham
e não me sentem!

Ah! quanta vontade
quanto dizer que sim
que venham todos e chamem os sonhos
sem baterem palmas
sem serem livros e gestos
poemas pendurados à porta
e, meter-me no sorriso do homem
que me apareceu, pela frente
a olhar
sem me ver...

José Manuel Capêlo, corpo-terra, Trelivro, 1982

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